[Medo e Delírio]

[Leia ouvindo "Fear and Loathing" - Marina and The Diamonds]
[O sol está reluzente lá fora. A tempestade troveja aqui dentro]
[Me diga que está tudo bem e que tudo vai passar amanhã quando eu acordar]

         Me diz que o céu está mais claro e que eu não preciso ter medo de colocar os dois pés lá fora com medo da tempestade. Me diz que está tudo claro e que eu não preciso ter medo, que meus medos não são reais. Eu venho levantado todos os dias pela manhã e me sentado na beira da cama tentando achar um único motivo para ir lá fora. Meu namorado ainda não entendeu o motivo pelo qual eu o beijo freneticamente num segundo e no outro eu pulo fora. Os caras por quem eu me apaixonei nunca entenderam o motivo de eu ir embora antes que desse certo ou errado - eu nunca fico pra assistir. Há muito tempo eu vivo na fronteira. E já dizia Lia: eu vivo no mundo limítrofe, onde a palavra terapia soa como exorcismo, e eu tenho mesmo muitos demônios para expulsar. Meus amigos ainda não entenderam o meu estado catastrófico de cada dia. Eles ainda não sabem que um dia desses, quando ninguém estiver olhando, eu vou tropeçar e o vento vai me levar para um lugar feliz e distante com apenas um casaco. Meus professores antigos ainda não entenderam porque a aluna cheia de potencial capengava nos quatro cantos do mundo e não era tão participativa assim. Os velhos amigos ainda acham que eu sou tímida. E ainda tem aqueles olhos. Os grandes olhos que ficam me observando quando eu cometo algum erro. Mamãe diz que eu sou mestre em criar o caos do nada. Eu digo que não sinto fome e vou para a escola sem tomar café. Eu me alimento de poesia, de preferencia, algum autor decadente cheio de furor e demônios quanto eu. Quando estamos de mãos dadas, ele me pergunta do que eu tenho medo, se eu tenho medo de morrer. Eu digo que não. Nessa vida eu tenho medo de três coisas: grandes abismos, facas pontudas e confesso que sim, tenho medo de viver. Tenho medo de viver assim, com o peito meio aberto, inflamado. Tenho medo de me perder numa dessas esquinas que garotas leves demais vão parar, cheias de ócio com os olhos e coração vidrados. A cabeça de pássaro que elas carregavam sobre o pescoço alcançou altos voos e foi para um lugar muito bonito. Quer dizer, eu espero que seja bonito, do contrário, do que adiantaria? Eu não sei de muita coisa nessa vida, estou de passagem nesse mundo fazem poucos anos, mas eu tento me convencer todos os dias com o lixo da autoajuda que ainda tem muito para se ver. Minha psicologa me disse que eu tenho medo de ser amada. E talvez eu tenha mesmo e talvez por isso que ninguém me ame. Ah não, todos me adoram e me acham incrível - exceto quando eu estou em crise e viro a bomba-relógio: imprevisível. Exceto quando eu estou deprimida demais para pisar lá fora: antissocial. Exceto quando eu não tenho limites e amo com toda a loucura do meu coração varias gentes nesse universo louco: A catastrófica, confusa. É nessas horas que eu penso em comprar um maço de cigarro, mas eu só penso. Um dia cheguei até a pegar um. Girei nos meus dedos. Me senti gente grande quando entreguei minha identidade e talvez tenha sido aí que eu percebi que ser adulto é mesmo uma droga. Ao invés de fumar eu voltei para casa e raspei o lado do meu cabelo. Assim mesmo. Do nada. Meu medo é que da próxima vez, num desses ataques de preciso-fazer-alguma-coisa-qualquer-coisa-para-sair-da-inércia eu não erre o corte acabe acertando uma artéria invisível sobre a pele. Eu pensava que seria tão diferente quando ficasse mais velha. Eu chutaria minha bunda se o meu eu de quinze anos atrás se encontrasse com o meu eu atual. E é louco, sabe? Eu sei que vai passar. As crises sempre passam com alguns comprimidos brilhantes, boa sorte e uma noite bem dormida, mas meu emocional não gosta de bater papo com o racional. e o racional está de saco cheio do emocional. E nisso parece que eles estão se divorciando e fazendo as malas. O oco do meu peito foi o lugar escolhido para alguns fantasmas entrarem e me embalarem com canções de ninar melancólicas e terríveis enquanto contam histórias horríveis ao meu respeito. Então por favor, continua me dizendo como eu sou mestre em criar o caos do nada. É verdade, eu sou a agente do caos. Continua me dizendo para botar os dois pés lá fora, afinal, as nuvens já saíram e o tempo abriu. Mas em nome de qualquer coisa em que você acredite, não me diga para ver o sol brilhando quando a minha cabeça está borbulhante com vários relâmpagos e raios. Se for o caso segure minha mão até eu tomar coragem para sair com meu guarda chuva e minha boa vontade. Se for o caso, me beije suavemente enquanto eu tento perder o fôlego por qualquer outro motivo. Se for o caso, pegue sua mala de mão e vá se bronzear. Afinal, o dia está lindo lá fora. 

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