[A Dama das Camélias]
["Belas Camélias ou mesmo flores qualqueres, às vezes é tudo que podemos ter"]
[Leia ouvindo "Hope Is A Dangerous Thing For A Woman Like Me To Have - But I Have It" - Lana Del Rey]
Estamos elencadas no rol das coisas desimportantes. As marcas de expressão já começaram e não há mais músicas sobre a gente. Os sapatos não deixam de servir nos pés, porque já não crescemos. Não há declarações na escada com poemas-mentirosos vibrantes declamados ao pé do ouvido. Os livros emprestados já foram esquecidos. E fazer amizades ficou mais difícil. Acompanhamos a vida dos nossos amigos com encontros semestrais ou por telas de cristais que nos mostram pequenos sorrisos esperançosos e conquistas falseadas. Somos felizes, é verdade, mas somos profundamente deprimidos. Nossas caixas de remédios e visitas ao psiquiatra atestam essa hipótese médica, afinal, é o mal do século.
Apesar das perdas irreparáveis (já dizia Sylvia Plath, enquanto se esticava para alcançar um figo), os pequenos prazeres nos tiram para dançar vez ou outra. E passamos uma noite inteira em camarotes de óperas, sentindo o cheiro das Camélias e assistindo à Carmen morrer. Somos beijadas de canto e tiradas para dançar. Sentimos o doce na boca, e às vezes as vozes que dizem coisas feias murmuram elogios. Somos convidadas a brilhar no palco e mesmo com as pernas bambas, subimos. É engraçado ser adulta, mas não deixa de ser trágico: boletos a pagar, filhos a criar, uma vida inteira para viver, o medo da velhice sendo pior que o medo de morrer. Os e "ses" e os "quandos" aparecem em todos os nossos pesadelos abraçados à Vênus de Botticelli que nos lembra que até ela, tão linda que era, precisou cobrir todos os seus pecados.
Mas ser adulta é um ato de resistência. É quando contrariamos as expectativas que criam ao nosso respeito. É quando olhamos para as estradas que correm na nossa frente levando a várias linhas de chegada, desenhando o destino, e decidimos - por pura pirraça e rebeldia - andar mais devagar, pegar um atalho, respirar mais fundo.
Às vezes, para contrariar as expectativas, eu começo a refeição pela sobremesa.
Às vezes, para disfarçar a minha maturidade, eu rio feito louca, até doer a barriga de algo que não teve graça.
Às vezes, para burlar as estatísticas, eu decido não morrer. E vivo outro dia.
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