[Inconsolável]
[Leia Ouvindo "Cinnamon Girl" - Lana Del Rey]
[ "Virgília transmitia uma febre aos homens. Uma febre de 40 graus que comportava delírio e outras sensações. Ela possuía olhos de ninfa, uma raridade. Teria sido devota de Vênus se esta existisse. Ela era um corpo confortável, uma mente inquieta e uma alma bonita, apesar de ser extremamente maldosa. Sua febre era transmitida através de pequenas olhadelas, espasmos e toques sutis de mãos. Deixava que os homens chorassem em seu colo em pequenos momentos de desespero. Acariciava seus cabelos e cantava suas canções de ninar favoritas. Virgília era assim: um ponto de consolo para os desesperados por amor. Para os famintos por uma mulher. Mas nunca foi amada" - V.S, 2020].
Você me ligou às duas da manhã. Me disse que precisava ser amada com uma urgência cega. "Eu preciso falar com alguém que sempre vai me amar", você disse como que numa prece. Calei-me, porque não podia te amar. Você desatou a falar que a solidão era dolorida e que certas dores eram desmedidas no peito. Você falou de erros e descontextos. Falou de passados e do que era irremediável. As perdas irremediáveis que não podem ser postas em níveis de importância, só em silenciosos lutos, afinal, bons adultos não reclamam do que já perderam, por mais que sintam falta de tapinhas nas costas e palavras de incentivo, bem como abraços apertados. Eu tento fazer o que posso pelo telefone. Não posso te amar do jeito certo e não me desculpo. Mas posso mentir por essa noite. "Eu te amo", sussurro, mesmo que isso não seja verdade. "Você está indo bem", eu suspiro, mesmo que ela pareça um caminhão desgovernado atropelando seus próprios sonhos. "Vamos marcar de sair", eu proponho, mesmo sabendo que não nos vemos há cinco anos e pouco e que nunca mais vamos nos ver. Eu te prometo abraços e amor incondicional pois ainda estou num limbo, preso no mundo das ideias onde você fantasia com girassóis e amores perfeitos. Você parece satisfeita com as ilusões que despejei aos seus pés. Você também sabe reconhecer mentiras; mas precisa tanto desse amor fingido que o aceita. Agradece. Desliga o telefone.
Eu penso que amanhã trabalho cedo. Penso em abrir outro vinho e maratonar alguma sitcom que costumávamos ver juntos. Penso que a semana vai ser puxada e que talvez não saia para dançar nem uma única vez. Penso nos amigos que estão procurando emprego. Penso nos que estão casando. Penso nos que estão tendo filhos e filhos. Penso nos planos que fiz com dezessete e em como não conseguiria alcançá-los mesmo percorrendo milhas e milhas e milhas. Sorrio. Sorrio. Sorrio. O relógio não para e os amores esmaecem. E eu não tenho para quem ligar para pedir um amor incondicional. Me sinto pequeno. Frágil. Solitário. São três da manhã e eu preciso ser amado com uma urgência cega.
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